segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

carta número três

minha densa e encantadora alice,
me desculpe por deixar essa carta na caixa de correio e não por debaixo da porta como das outras vezes, mas me envergonha não ter a dália vermelha como dama-de-companhia, seguindo o exemplo anteriores. eu poderia dizer qualquer coisa, mas em casos como esse - todos que referem-se à ti - opto pela verdade: eu não quis. sequer procurei a mais bonita como das outras vezes, como nos outros anos. não, meu amor. me desculpe.
talvez eu já não seja mais tão romântica como quando te conheci - apaixonada sim, disso tenho certeza - mas bem, eu nunca fui dada a grandes demonstrações de afeto, tu bem sabes. as dálias já haviam tornado-se algo sem o mesmo fervor do início - para que de fato, foram feitas. dálias foram feitas para que causassem paixão, afinal de contas. e paixão dilacera.
tenho pensado muito sobre essas coisas sabe? não, não a paixão nem o fervor. sobre flores e frutas. as flores são bonitas mas tão sem-nada-para-se-descobrir. não te cansam essas coisas de não haver nada mais para se conhecer, desvendar, interpretar? a mim me cansam.
tenho pensado em morangos. um morango nunca vai ter o mesmo gosto da primeira mordida, na segunda. um morango é vermelho-gordo. acho bonitos. assim sabe, delicados e com a cara a tapa. a cara vermelha e rechonchuda que só um morango poderia ter.
tenho pensado em figos, também. na verdade bem mais em figos que em morangos. acho os figos explêndidos! são tão pequeninhos e durões e cheios daquele arzinho de superioridade forjado. ainda que bonitos out, o melhor do figo encontra-se in. é que quando sente-se o 'dentro' do figo, que se vê que tem milhões de pedacinhos se espremendo ali dentro, quanta coisa boa tem o figo ali escondido dentro de si! deveria ser ao avesso né? não. porque o melhor de tudo é descobrir.
tenho pensado em figos, tenho pensado em morangos, e melhor que isso, tenho pensado na combinação dos dois. é absolutamente incrível os diversos sabores que as duas mesmas frutas podem causar ao paladar. vai ver são inconstantes. vai ver se amam e se completam e se querem e se combinam tanto que até quando mudam, mudam do mesmo jeito, cada um pro seu lado.
pode rir, docinho, sei que não tem sentido o que tenho dito. morangos com rostos, figos interessantes, combinações amorosas. nada disso faz sentido. nunca fez.
acho cartas nas caixas de correio tão secas, tão frias.
não sei como me terminar, então, até logo meu amor.
ps¹: sobre eu não ser mais tão romântica, eu menti.
ps²: sobre o amor não ter nada a ver com figos e morangos, eu menti.
ps³: uma mentirosa nata, obrigada. agora meu amor, delicie-se com os figos e morangos que deixei no fundo da caixa do correio.
sempre, sempre tua, stella.

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